OBS. 1: Não falamos exclusivamente sobre o filme, neste post, pois aproveitamos as polêmicas que envolvem o relato do Livro do Gênesis e do pseudo-epígrafo Livro de Enoque (cujos elementos estão presentes no longa) para falarmos sobre a perspectiva que afirma que os “filhos de Deus”, de Gênesis 6, são “anjos” e que os mesmos ensinaram os homens todo o seu conhecimento e coabitaram com mulheres, gerando uma raça híbrida, chamada nefilim ou gigantes. O texto a seguir pode contém spoilers do filme. Se você não quer saber detalhes sobre a produção, não leia os trechos que estão marcados.
Confesso que há meses estava com uma expectativa muito grande para assistir “Noé”, megaprodução do diretor judeu Darren Aronosky. Admito, contudo, que estava desconfiado, pois todo o “zum-zum-zum” sobre o trabalho de Aronosky girava em torno de “Cisne Negro”, filme ganhador do Oscar, cuja estrela principal fora a atriz Natalie Portman. Aronosky – que deu várias entrevistas afirmando sempre “ter sido fascinado pela história bíblica de Noé” -, é um autor de drama… ganhou o maior prêmio de sua carreira com um filme melodramático e psicológico. A proposta de “Noé”, porém, é completamente diferente. Como toda grande história bíblica, a história de Noé só pode ser contada de duas maneiras: ou se segue o que a Bíblia diz, ou não! Ficar no “meio-termo”, no “chove não molha” , com elementos que combinam e contradizem a história bíblica, a esmo, sem qualquer explicação do porquê deste elemento ter coincidido com a Bíblia, enquanto aquele não, é um caminho perigoso e na grande maioria das vezes, inócuo. Não é à toa, neste caso, que inócuo parece com “oco”: essa é a sensação que o filme de Aronosky transmite após suas mais de duas horas de exibição. O filme tem sua dinâmica, todos ou quase todos os elementos estão lá, mas estes elementos não se combinam corretamente, dando-nos a impressão de que realmente falta substância à história. Os produtores e o diretor de “Noé” tentaram amenizar as críticas que o filme tem recebido (tanto de círculos religiosos quanto de não religiosos) apelando àquela velha ideia de “licença poética”, como se isso pudesse signifcar a descaracterização completa de elementos fundamentais da história.
A Bíblia é um livro revelacional e , sendo assim, suas histórias têm como objetivo explicitar algum aspecto da dogmática judaico-cristã. É um livro de moral, mas a moral divina, que sempre contrasta com a moralidade (ou amoralidade) humana, que está manchada por conta da Queda do primeiro homem, o pai de toda a raça humana: Adão. Esta atitude atual de se mostrar o Homem como uma “praga” é algo difícil de conceituar, porque facilmente chega-se a extremos. Pela Bíblia, é fato que o homem trouxe um mal terrível ao mundo, por conta da Queda. Isto ocasionou, tanto nos dias anteriores, quanto aos posteriores ao dilúvio, um estado de caos, violência, desigualdades e muita miséria. Contudo, não é possível que neguemos que o ser humano, como criado à imagem e semelhança de Deus, possua coisas boas, um entendimento correto acerca do bem e do mal, algo que o impele para também fazer o bem, a investigar a natureza e produzir algo bom para si e tudo o que o cerca. Esta tensão nas atitudes humanas é um ponto dificultoso na análise atual do Homem em relação à natureza, o que está em clara evidência no filme estrelado pelo ator Russel Crowe, que faz o personagem principal. Percebe-se de imediato no filme que a Terra está devastada por causa da ganância do Homem: cenas de desertos áridos, pedregosos, com paisagens de árvores cortadas e de animais sendo caçados por homens é algo comum na película. Fala-se até mal do hábito carnívoro, como se fosse algo em si ruim, uma consequência do pecado humano o fato de comermos carne de alguns animais.
ATENÇÃO, O TRECHO A SEGUIR COMENTA CENAS DO FILME
Mas, ok. Até poderíamos inferir que trata-se apenas de uma desagradável mistura de dogma antibíblico alinhado ao pensamento politicamente correto que está varrendo a Terra mais rápido do que as cidades dos “filhos de Caim”. Só que a coisa não pára por aí. No filme não se explica porquê os “anjos caídos” ou “Sentinelas” ajudam os filhos dos homens na construção das cidades e em todo o modus vivendi e operandi que será a causa da destruição do mundo. Digo isso pois este é o ponto mais fraco e decepcionante do filme: os anjos caídos. É quase que um consenso entre os principais estudiosos da Bíblia que os chamados “filhos de Deus” de Gênesis 6 sejam anjos ou “seres espirituais” que, conforme nos dizem as Escrituras, “deixaram sua própria habitação”. O problema (histórico) se dá em como a Igreja tem interpretado o significado de “espiritual” e “anjo”. Vejamos o que a Bíblia diz acerca dos ANJOS caídos: “E a anjos, os que não guardaram o seu estado original, mas abandonaram o seu próprio domicílio, ele tem guardado sob trevas, em algemas eternas, para o juízo do grande Dia; como Sodoma, e Gomorra, e as cidades circunvizinhas, que, havendo- se entregado à prostituição como aqueles, seguindo após outra carne, são postas para exemplo do fogo eterno, sofrendo punição“. Judas 1:6-7 Alguns afirmam que Judas está se referindo à Queda dos anjos após a rebelião de Satanás.
Mas, textualmente, isso é duvidoso… porque: A) em primeiro lugar, Judas cita o controverso “Livro de Enoque”, um pseudo-epígrafo que, ao que tudo indica, foi escrito no período interbíblico, mas que contém ensinos que o autor sagrado julgou pertinentes e necessários, inclusive citando-o literalmente, conforme pode ser visto em Judas 1:14-5, – cf. com Enoque 2:1. B) Em segundo lugar, o texto por nós destacado no Livro de Judas, que trata sobre o “abandono” dos anjos do seu “estado original”, liga-se à “prostituição”, conforme procederam os habitantes de Sodoma e Gomorra e das cidades circunvizinhas, as quais foram destruídas por Deus. A palavra traduzida por “domicílio”, no texto bíblico, é o grego “οικητηριον” (“oiketerion”), cujo verbete pode ser traduzido por “lugar do corpo para a habitação do espírito“. É-nos dito em 2 Coríntios 5:2 que seremos revestidos de nosso “novo domicílio espiritual”: “E, por isso, neste tabernáculo, gememos, aspirando por sermos revestidos da nossa habitação celestial; se, todavia, formos encontrados vestidos e não nus“. Esta é SEGUNDA E ÚNICA passagem bíblica em que encontramos o termo “oiketerion”, e em ambas o termo refere-se a “corpo espiritual”, um novo “domicílio espiritual”. Isto não era novidade aos cristãos do Novo Testamento, pois o Apóstolo Paulo nos diz sobre o “soma pneumatikos” (“corpo espiritual”): “Semeia- se corpo natural, ressuscita corpo espiritual. Se há corpo natural, há também corpo espiritual“. 1 Coríntios 15:44.
Os atores Russel Crowe, “Noé” (a esq.) e Ray Winstone, “Tubalcaim” (à dir.)
Assim, temos que houve uma miscigenação nos dias de Noé, algo que comprometeria toda a carne e que causara um mal extremo à raça humana, conforme nos dizem os livros de Gênesis e Enoque. Não tomamos o Livro de Enoque como “inspirado”, em absoluto. Mas, entendemos que, se o livro foi bom o bastante para ser citado ipsis literis pelo autor sagrado, então devemos prestar atenção àquilo que o livro diz, separando o que se alinha e o que porventura não se alinhe à mensagem bíblica. O fato é que deve ter acontecido realmente algo muito maligno, inclusive na carne humana, para que houvesse uma destruição global, como nos dias do dilúvio, e uma destruição pontual, como foi o caso das cidades de Sodoma e Gomorra e circunvizinhanças. Observe que o autor sagrado, o Ap. Judas, fala que os habitantes de Sodoma e Gomorra seguiram outra carne. Sabe-se que os habitantes de Sodoma foram “pecadores extremos” diante de Deus, pois, ao que tudo indica, iniciaram no mundo a prática do homossexualismo. Isso fica claro quando lemos sobre o que acontece quando os anjos vão livrar Ló da destruição da cidade, conforme nos registra Gênesis 19:1-11:
“Ao anoitecer, vieram os dois anjos a Sodoma, a cuja entrada estava Ló assentado; este, quando os viu, levantou- se e, indo ao seu encontro, prostrou- se, rosto em terra. E disse- lhes:Eis agora, meus senhores, vinde para a casa do vosso servo, pernoitai nela e lavai os pés; levantar- vos- eis de madrugada e seguireis o vosso caminho. Responderam eles:Não; passaremos a noite na praça. Instou- lhes muito, e foram e entraram em casa dele; deu- lhes um banquete, fez assar uns pães asmos, e eles comeram. Mas, antes que se deitassem, os homens daquela cidade cercaram a casa, os homens de Sodoma, tanto os moços como os velhos, sim, todo o povo de todos os lados; e chamaram por Ló e lhe disseram: Onde estão os homens que, à noitinha, entraram em tua casa? Traze- os fora a nós para que abusemos deles. Saiu- lhes, então, Ló à porta, fechou- a após si e lhes disse:Rogo- vos, meus irmãos, que não façais mal; tenho duas filhas, virgens, eu vo- las trarei; tratai- as como vos parecer, porém nada façais a estes homens, porquanto se acham sob a proteção de meu teto. Eles, porém, disseram:Retira- te daí. E acrescentaram: Só ele é estrangeiro, veio morar entre nós e pretende ser juiz em tudo? A ti, pois, faremos pior do que a eles. E arremessaram- se contra o homem, contra Ló, e se chegaram para arrombar a porta. Porém os homens, estendendo a mão, fizeram entrar Ló e fecharam a porta; e feriram de cegueira aos que estavam fora, desde o menor até ao maior, de modo que se cansaram à procura da porta”.
As lendas de gigantes antigos estão presentes, assim como a história de um dilúvio global, em praticamente todas as culturas antigas. A imagem acima ilustra uma das muitas histórias de gigantes vivendo entre os antepassados dos índios norteamericanos.
Pois bem, admitamos que um grupo de anjos caídos veio à Terra nos dias dos ascendentes de Noé, abandonou seu domicílio (oiketerion), desceu no Morte Hermon e lá fez um juramento de que não iria “voltar atrás” no desígnio de desobedecer a Deus, indo após outra carne, fazendo o que não lhe era natural e atraindo grande condenação sobre si. Admitamos, por um momento, que isso é um fato. Agora, vejamos se tal hipótese “fere” o que a Bíblia diz… ou se é o nosso próprio convencionalismo. Como disse anteriormente, um dos problemas reside naquilo que entendemos ou convencionamos com o termo “espiritual”. O que significa este termo? Vejamos o que nos dizem as Escrituras acerca dos anjos e do reino “espiritual”: “Respondeu- lhes Jesus: Não provém o vosso erro de não conhecerdes as Escrituras, nem o poder de Deus? Pois, quando ressuscitarem de entre os mortos, nem casarão, nem se darão em casamento; porém, serão como os anjos nos céus.Quanto à ressurreição dos mortos, não tendes lido no Livro de Moisés, no trecho referente à sarça, como Deus lhe falou: Eu sou o Deus de Abraão, o Deus de Isaque e o Deus de Jacó? Ora, ele não é Deus de mortos, e sim de vivos. Laborais em grande erro“. Marcos 12:25-27. A primeira coisa que nos salta aos olhos no texto acima é a expressão “…serão como os anjos“. Como assim? Bem, para que respondamos a pergunta, é interessante que observemos toda a sentença. Jesus está falando, neste texto, sobre a RESSURREIÇÃO DOS MORTOS.
Só quando os homens RESSUSCITAREM DOS MORTOS é que serão COMO OS ANJOS (nem antes, nem depois). Logo, não é na morte que os homens serão como os anjos, MAS NA RESSURREIÇÃO. Ora, nós teremos um “corpo revestido de incorruptibilidade”: “Eis que vos digo um mistério: nem todos dormiremos, mas transformados seremos todos, num momento, num abrir e fechar de olhos, ao ressoar da última trombeta. A trombeta soará, os mortos ressuscitarão incorruptíveis, e nós seremos transformados. Porque é necessário que este CORPO corruptível se revista da incorruptibilidade, e que o CORPO mortal se revista da imortalidade.” 1 Coríntios 15:51-53. Ora, é em CORPO (imortal) que “seremos como os anjos”. Em nenhum lugar das escrituras está se dizendo que “os anjos são assexuados“. O texto de Marcos diz que nós “seremos como os anjos”, ou seja, não mais casaremos e nos daremos em casamento… pois este é o estado dos anjos. “Não casar”, portanto, e “ter um corpo espiritual (incorrptível)” é o que pode nos ligar à condição similar a dos anjos. Não seremos anjos (a Bíblia não diz isso), mas como os anjos, tendo corpos incorruptíveis, vivendo exclusivamente para Deus. Realmente, não poderíamos ser anjos, pois, assim, seríamos transformados em outra coisa, que não homens com corpos glorificados (incorruptíveis). Os anjos jamais deveriam saber o que é o contato carnal do sexo e muito menos a procriação…. e é por isso que entendemos a gravidade do erro cometido pelos anjos, nos dias de Noé, e sua não menos grave punição.
Esta imagem em alto relevo pode ser a descrição de um antigo rei gigante sumeriano.
A Bíblia assim relata os dias de Noé: “Como se foram multiplicando os homens na terra, e lhes nasceram filhas, vendo os filhos de Deus que as filhas dos homens eram formosas, tomaram para si mulheres, as que, entre todas, mais lhes agradaram. Então, disse o SENHOR: O meu Espírito não agirá para sempre no homem, pois este é carnal; e os seus dias serão cento e vinte anos. Ora, naquele tempo havia gigantes na terra; e também depois, quando os filhos de Deus possuíram as filhas dos homens, as quais lhes deram filhos; estes foram valentes, varões de renome, na antiguidade. Viu o SENHOR que a maldade do homem se havia multiplicado na terra e que era continuamente mau todo desígnio do seu coração; então, se arrependeu o SENHOR de ter feito o homem na terra, e isso lhe pesou no coração. Disse o SENHOR:Farei desaparecer da face da terra o homem que criei, o homem e o animal, os répteis e as aves dos céus; porque me arrependo de os haver feito. Porém Noé achou graça diante do SENHOR. Eis a história de Noé. Noé era homem justo e íntegro entre os seus contemporâneos; Noé andava com Deus. 10 Gerou três filhos: Sem, Cam e Jafé“. Gênesis 6:1-9 com notas de Strong. O que nos chama à atenção de imediato é a expressão que está sublinhada. A palavra traduzida por “gigantes” é “נפיל” ou (“nephil”), provenientes da palavra “נפל” (“naphal”), cuja tradução pode ser “gigantes” ou “caídos”. Estes são claramente o fruto da união dos “filhos de Deus” com as “filhas dos homens”.
Esta corrupção do gênero humano, segundo o Livro de Enoque, começa nos dias de “Jared”, um ascendente de Enoque: “E aconteceu depois que os filhos dos homens se multiplicaram naqueles dias, nasceram-lhe filhas, elegantes e belas. E quando os anjos, os filhos dos céus, viram-nas, enamoraram-se delas, dizendo uns para os outros: Vinde, selecionemos para nós mesmos esposas da progênie dos homens, e geremos filhos. Então seu líder Samyaza disse-lhes: Eu temo que talvez possais indispor-vos na realização deste empreendimento; E que só eu sofrerei por tão grave crime. Mas eles responderam-lhe e disseram: Nós todos juramos; (e amarraram-se por mútuos juramentos), que nós não mudaremos nossa intenção mas executamos nosso empreendimento projetado. Então eles juraram todos juntos, e todos se amarraram (ou uniram) por mútuo juramento. Todo seu número era duzentos, os quais descendiam de “Ardis” (“Ardis” é uma transliteração de “Jarede” e a frase pode ser entendida como “os quais procederam dos dias de Jarede“- grifo nosso. Livro de Enoque, cap. 7:1-7).O interessante aqui é que o Livro de Enoque, da tradição rabínica vétero-testamentária, cita os nomes dos “filhos dos céus” (ou “Sentinelas”), suas especificidades, ou seja, o quê realmente eles ensinaram aos filhos dos homens e como parecem ter se “arrependido” de seu mal, mas não foram ouvidos pelo Criador: foram “amarrados” e enviados ao “abismo” ou “tártaro”, sendo um deles, chamado Azazel (talvez o pior de todos) sido amarrado em um deserto e coberto de pedras para que não veja a luz. TODOS os anjos caídos (os 200 que eram liderados por Samyaza) foram amarrados até o juízo:
A ideia de “seres espirituais” (i.e., com “corpos espirituais”) coabitando com as mulheres humanas é antiga. A história descrita no Livro do Gênesis pode ter inspirado culturas posteriores, que deram àqueles anjos caídos o status de “deuses”.
“Além disso, Azazyel ensinou os homens a fazerem espadas, facas, escudos, armaduras (ou peitorais), a fabricação de espelhos e a manufatura de braceletes e ornamentos, o uso de pinturas, o embelezamento das sobrancelhas, o uso de todo tipo selecionado de pedras valiosas, e toda sorte de corantes, para que o mundo fosse alterado. A impiedade foi aumentada, a fonicação multiplicada; e eles transgrediram e corromperam todos os seus caminhos. Amazarak ensinou todos os sortilégios, e divisores de raízes; Armers ensinou a solução de sortilégios; Barkayal ensinou os observadores das estrelas, Tamiel ensinou astronomia; E Asaradel ensinou o movimento da lua, E os homens, sendo destruídos, clamaram, e suas vozes romperam os céus“. Enoque 8:1-9. Cf. Ibid. 7:9-11 (sobre os gigantes ou nephilim), 9:5, 10:1-17. ATENÇÃO, O TRECHO A SEGUIR COMENTA CENAS DO FILME Como se vê, há muito material que poderia ter sido trabalhado na produção “Noé”, mas que, no caso específico do longa de Aronosky, foi aumentada ao ponto da desconfiguração completa da história, por aquilo que os produtores chamaram de “licença poética”. É claro que uma história, mesmo uma baseada em fatos reais, cujas informações são esparsas (como é o caso do dilúvio bíblico), tem de seguir uma linha com coerência. Não é coerente ressaltar alguns aspectos da história bíblica e/ou pseudo-epígrafa e, arbitrariamente omitir outras.
A história ficou completamente sem sentido. Por exemplo, no livro do Gênesis, nos é dito que, após o dilúvio, Noé, que era lavrador, planta uma vinha, embriaga-se com vinho e fica nu na sua tenda. Cão, um de seus três filhos, vê a nudez de seu pai e o faz saber a seus irmãos, Sem e Jafé. Estes, por sua vez, com uma vestimenta, vão andando de costas (para não verem a nudez de seu pai) e o cobrem. Depois de desperto do efeito do vinho, Noé proclama sentenças nas quais abençoa a Sem e a Jafé, mas amaldiçoa Canaã, o filho mais novo de Cão. Apesar de a história não ser contada literalmente no filme, ela está lá. Por que ela está lá, se aspectos mais importantes do relato do próprio dilúvio não estão? Qual a base para se colocar um relato que, em comparação com a cerne da história, é meramente secundário? Ora, se houvesse o registro das bênçãos e maldições proferidas por Noé, tudo bem, mas não há isso no filme. Vê-se um jovem Cão confuso, que parece ter mais amor pelos homens do que Deus. Não há pregação de justiça por parte da linhagem de Set, o terceiro filho de Adão e Eva, que Deus lhes dera após a morte de seu filho Abel pelas mãos de seu irmão, Caim.
Imagem do filme “Noé”, de Darren Aronosky: os “anjos caídos” ou “Sentinelas”: se a base de tal história foi o Livro de Enoque, porque a história do filme não foi fiel à do livro? Os “anjos caídos” são retratados de uma forma confusa e aparentemente arbitrária, dando aquela sensação de pura mitologia, como em “O Senhor dos Anéis”, só que sem o enredo da obra de R. R. Tolkien. Maçante.
A Bìblia diz que Noé fora pregador de Justiça (2 Pedro 2:5), então é inconcebível ver um Noé que se esquiva dos homens, escondendo-se com a sua família. Ao mesmo tempo, vê-se homens que matam por nada, agem como animais irracionais, na medida em que os nefilim são vistos quase como figuras mitológicas à lá Senhor dos Anéis, o que, com certeza, irá confundir muito o público. Ora, se aqueles gigantes são a mesma coisa dos anjos caídos e são tão “bonzinhos” – ou seja, se a história difere tanto do relato bíblico e do de Enoque -, então por que manter os nomes dos anjos caídos? Ora, se eles são os mesmos descritos no livro de Enoque, então se relacionaram desobedientemente com mulheres, aprovaram as ações desoladoras de seus filhos gigantes (que, dentre outras atrocidades que cometiam, eram canibais e vis assassinos, conforme o Livro de Enoque), além de nada fazerem após virem, no decorrer das eras, os filhos dos homens degenerando totalmente o seu caminho mediante os ensinos que eles mesmos lhes haviam trazido. É por essas e outras que o filme “Noé”, ao que parece, tem tudo para se tornar um dos maiores fiascos cinematográficos da história. Pode até ter estreado em primeiro lugar nos EUA, mas o tempo dirá se minha análise está certa ou não.
Muitas pessoas não aceitarão o filme, que, como dissera no início, quer agradar a gregos e troianos. Se se coloca um relato da Criação a partir de Deus, com ingerências diretas de Deus na mesma, por que retratar a evolução das espécies, se isto não está nem de longe descrito na Bíblia? Foi uma infantilidade de Aronosky inserir, no relato da Criação, um viés evolucionista, o que se transformou num aspecto completamente nonsense do filme. Na ocasião em que vi o longa, pelo que percebi, o público não esboçou nenhuma reação (o cinema estava cheio), dando a entender que o filme claramente se colocava como mais do mesmo, ou seja, mais um no nível do politicamente corretos de Hollywood, mostrando um ser humano irracional e excessivamente mau, uma verdadeira “praga” para a natureza inocente, doce e que merece mais a terra do que o próprio Homem. A maldade dos seres humanos é repleta de histeria, como se os tais vivessem em orgias de sangue e violência desmedida, sem qualquer menção ao pecado, àquilo que fora realmente a causa da degeneração humana e que manchara de fato a criação de Deus desde o primeiro momento que surge nos corações dos homens. Isso, no filme, e mais uma parcela do show de discrepâncias em relação à história bíblica (aquela de Tubalcaim entrando escondido na arca foi demais!…) tornando o filme de Aronosky insípido, confuso, arbitrário e, por isso tudo, desinteressante. Não o indicaria sequer para um mero momento de descontração sem compromisso, como é o caso da maioria das pessoas que vai ao cinema por puro entretenimento. Totalmente descartável.
OBS. 2: breve estarei postando um outro estudo, sobre o “anjo” Azazel e uma provável menção que a Bíblia faz deste ser.
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